A nível mundial, as cheias e as consequentes inundações fluviais são as catástrofes mais comuns, representando 44% das manifestações registadas no período compreendido entre 2000 e 2019, de acordo com a United Nations Office for Disaster Risk Reduction (UNISDR). Afetaram, nesse período, 1,6 mil milhões de pessoas em todo o mundo, o valor mais elevado quando comparado com outros tipos de catástrofes.

À escala europeia, nestas últimas décadas, as cheias e as inundações representaram cerca de 1/3 das perdas causadas por fenómenos naturais e, na União Europeia, os seus custos anuais médios ultrapassam 4 mil milhões de euros. Também na região mediterrânea, as cheias e inundações são consideradas as catástrofes com maior potencial de destruição, sendo de igual modo as que causaram o maior número de vítimas mortais e os danos materiais mais elevados.

Em Portugal, as inundações foram, de igual modo, o fenómeno natural mais frequente e mortífero durante o último século. A este propósito, recorde-se o evento ocorrido de 25 para 26 de novembro de 1967, na área da Grande Lisboa, com inundações a causarem um elevado número de mortos, a rondar cinco centenas, milhares de desalojados e inúmeras habitações destruídas. Também as cheias e inundações de 2001 imprimiram um rasto de destruição em várias bacias hidrográficas nacionais, destacando-se a do rio Mondego, onde o rebentamento de vários diques, a jusante de Coimbra, provocou mais de uma centena de desalojados. Em dezembro de 2019, apesar de se terem registado caudais bastante superiores aos assinalados na cheia de 2001, apenas colapsaram dois diques, deixando também vastas áreas da planície aluvial do rio Mondego submersas pela água, com inúmeras povoações isoladas, estradas cortadas e danos muito significativos em múltiplas infraestruturas e nos campos agrícolas.

Na bacia do Mondego, à semelhança de outras bacias do território nacional, as cheias e as inundações são seculares e, apesar das obras de regularização realizadas na bacia hidrográfica, elas continuam a ocorrer, provocando avultados prejuízos. Pode afirmar-se que o estado atual de conhecimento sobre os processos que conduzem à ocorrência de cheias e de inundações se encontra relativamente bem consolidado, integrando processos eminentemente naturais, a que se associam outros fatores desencadeantes ou agravantes de origem antrópica. Como justificar, neste contexto, a contínua manifestação dos riscos de cheia e de inundação, com consequências mais ou menos gravosas, ano após ano?